quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Conversa (In)formal


“- Muito bem - disse eu a eles.

- Eu sei. Vocês não sabem. Mas o que eu sei e vocês não sabem?

- O senhor sabe porque é doutor. Nós, não.

- Exato, eu sou doutor. Vocês não. Mas, porque eu sou doutor e vocês não?

- Porque foi à escola, tem leitura, tem estudo e nós, não.

- Por que fui à escola?

- Porque seu pai pôde mandar o senhor à escola. O nosso, não.

- E por que os pais de vocês não puderam mandar vocês à escola?

- Porque eram camponeses como nós.

- E o que é ser camponês?

- É não ter educação, posses, trabalhar de sol a sol sem ter direitos, esperança de um dia melhor.

- E por que ao camponês falta tudo isso?

- Porque Deus quer.

- E quem é Deus?

- É o Pai de todos nós.

- E quem é pai aqui nesta reunião?

Quase todos de mãos para cima, disseram que o eram.

Olhando o grupo todo em silêncio, me fixei num deles e lhe perguntei:

- Quantos filhos você tem?

- Três.

- Você seria capaz de sacrificar dois deles submetendo-os a sofrimentos para que o terceiro estudasse, com vida boa no Recife? Você seria capaz de amar assim?

- Não.

- Se você – disse eu - , homem de carne e osso, não é capaz de fazer uma injustiça desta, como é possível entender que Deus o faça? Será mesmo que Deus é o fazedor dessas coisas?

Um silêncio diferente, completamente diferente do anterior, um silêncio no qual algo começava a ser pratejado. Em seguida:

- Não. Não é Deus o fazedor disso tudo. É o patrão.”


Paulo Freire

Um mestre!


Shalom

Nenhum comentário: